O artigo de hoje desperta-me um interesse especial porque foca na "minha" geração. Digo "minha" porque acho que existe uma grande diferença entre os que nasceram na primeira metade dos anos 80 e os da segunda. E, ainda maior, entre os que nasceram nos anos 80 ou 90.
O artigo é intitulado "Os que aprenderam a transformar a necessidade em virtude". Que não concordo. Dos vintinhos aos trintinhos (segundo a definição do Miguel Esteves Cardoso) não acredito que sequer metade tenha tentado transformar fosse o que fosse. Que se tenha tentado adaptar à realidade que vive. São inflexíveis nos seus "ideais" ou direitos. E a prova está na elevada taxa dos que não estudam nem trabalham ("No ano passado, era de 14,1 a percentagem de jovens entre os 15 e os 24 anos que não estudavam nem trabalhavam").
Por isso acho que o título mais indicado deveria de ter sido o que foi associado à geração seguinte:
"Criados para aquilo que não podem ou não querem ser"Porque acho que fomos demasiadamente protegidos e pouco habituados a lidar com a fracasso. Lembro-me de colegas meus receberem consolas de jogos como motivação para o ano seguinte por terem chumbado. Ou os da segunda metade dos anos 80 receberem um carro como prémio por entrarem para universidade, isto é, por fazerem nada mais do que a sua obrigação. Assim, receber um não numa entrevista de emprego sem receber depois uma consola de jogos, torna a realidade muito mais difícil de enfrentar.
Logo fomos educados e formados para áreas que o mundo não pediu nem precisa porque comprámos a ideia de que podemos fazer aquilo que quisermos independentemente de alguém estar interessado nisso. O facto de existir já é por si só suficiente para ter direito a uma vida confortável (que chamamos de "digna" mas na realidade vem com mais alguns zeros). E tudo o que seja menos que isso é um falhanço e um assalto a um futuro por direito. Se por um lado não podemos ser aquilo que o mercado de trabalho precisa (porque escolhemos seguir uma área diferente), também não queremos ser os talhantes ou canalizadores porque somos muito mais que isso...mesmo estando no desemprego durante anos à espera de um emprego que não existe.
Do artigo destaco:
"Pôr os holofotes nos emigrantes qualificados pode servir para alimentar a narrativa do Portugal moderno, com que a geração Y cresceu. O risco disso será a ocultação dos não qualificados que partem, a maioria, e a desvalorização dos que ficam, como aconteceu noutras épocas, previne o historiador."
"Muitos pais esforçaram-se para dar aos filhos o que nunca tiveram. Tentavam prever as suas necessidades, protegê-los de todos os males, elogiar as suas proezas, recompensar os seus esforços, fazê-los acreditar que podiam ser tudo o que quisessem. Agora, esperam encontrar o mesmo reconhecimento e recompensa no mercado de trabalho. E sentem, diz José Machado Pais, “uma frustração relativa”. Há, salienta, um saldo negativo entre o que têm e que pensam que deveriam ter. E a comparação com os outros não ajuda."
"Não é uma perda de população “definitiva”. Muitos partem para situações precárias e reemigram ou regressam ao ponto de partida. Pouco ou nada, nesta geração, é para sempre."
“Ia sentir-me um bocadinho mal por a minha mãe e mesmo o Estado terem apostado em mim tantos anos e eu ir embora agora que já posso contribuir...”É muito fácil confundir comodismo com Patriotismo. Não é o caso da referida no artigo (porque trabalha) mas existem muitos casos de Patriotas desempregados durante anos que acusam os que saem de "fugir". O que é mais patriótico? Um subsídio de desemprego ou uma remessa de emigrante?
" Licenciada em Psicologia e pós-graduada em Terapias Expressivas, só conseguiu um vínculo estável na clínica da família. O pai, dentista, queria ajudá-la a abrir caminho, mas a clientela não justificava. "Curioso que se for o filho do Durao ou o irmao do vereador chama-se clientelismo, tachismo...corrupção. Mas se for para "os nossos" é apenas oferecer o lugar que merecem e que o sacana do mercado de trabalho recusou...estamos só a oferecer um lugar merecido porque o "País os desprezou". Ignorando que existem outras centenas com melhores qualificações que não tiveram a sorte de ter um lugar por ajuste directo. E o mais grave...é que este clientelismo, esta lei da cunha esta tão enraizado na nossa cultura que nem vergonha temos de o contar nas linhas de um jornal.
1 comentário :
Da geração de 70, criado e vivido num dos subúrbios da capital onde não existiam consolas ou telemóveis (wtf??) e os spectrum eram apenas para alguns, assisti ao que descreves no post. A malta andou enganada e quando foram confrontados com a realidade, foram literalmente atropelados e nem se aperceberam bem o que se passou. Já nos meus quarentas, também fui apanhado pelo downsizing, job market dumping ou outra qualquer buzz word que serve para justificar que apenas os sobrinhos e afilhados é que tem direito adquiridos. PQP. Em breve também estarei por Londres, sem olhar muito para trás. Talvez possamos beber um copo, who knows... Bom artigo. Abraço.
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